Nome Eduardo Antunes
Instituição Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
Áreas de investigação Média Digitais, Sociabilidades Digitais, Construção Identitária, Orientalismo
ORCID https://orcid.org/0000-0003-1372-8052
CIÊNCIA VITAE https://www.cienciavitae.pt//F119-78DC-B4B4
Como começou o teu percurso como investigador?
Honestamente, o início acaba por ser incidental. Após algumas experiências no mundo empresarial, como marketeer, dei por mim a sentir a necessidade de procurar outros caminhos. Mesmo durante o Mestrado em Jornalismo e Comunicação na Universidade de Coimbra, não tinha idealizado um percurso profissional de investigação. Mas foi durante esse mestrado que senti que era possível colocar em prática algumas inquietações sociais/sociológicas que carregava. A tese de mestrado foi o ponto de viragem e a primeira ocasião em que dei por mim a pensar: será que poderei ser um académico? Essa boa experiência levou-me ao Doutoramento em Ciências da Comunicação, que ainda estou a realizar, e nesse contexto a minha experiência profissional, como investigador, deu-se com a minha contratação como bolseiro para o projeto MyGender. Foram 2 anos e meio recentemente terminados a trabalhar de perto com uma pequena, mas forte e ambiciosa equipa, principalmente entre a professora Inês Amaral, professora Rita Basílio Simões e doutora Ana Marta Flores. A minha aprendizagem deu-se, sobretudo, colocando as mãos na massa, neste projeto de investigação. Por isso, não tenho outra forma de falar do meu ainda curto percurso como investigador, sem mencionar a experiência do projeto MyGender.
Qual foi o ponto de partida para o projeto de doutoramento que desenvolves? Fala-nos um pouco desse projeto.
A base é um caminho comum com o projeto MyGender, há um foco na ideia de jovens em idade adulta (dos 18 aos 30 anos) em Portugal utilizarem os média digitais de uma forma enraizada nas suas vidas. A partir daí, o meu projeto de tese em concreto foca-se em diferentes dinâmicas na construção das sociabilidades digitais por parte desses jovens e procura discutir o que entendem como pessoas desviantes. No fundo, estabelecer um diálogo entre conceitos opostos como normalidade e desvio, certamente trabalhando estereótipos, perceções e construções identitárias. Centralmente, trabalharei essas ideias (que surgiram de inquietações minhas mais antigas) na interligação com a utilização dos média digitais por parte de jovens em idade adulta (a parte mais resultante da minha experiência como investigador no projeto MyGender).
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Quais os principais desafios que encontraste no teu percurso enquanto investigador? E que estratégias adotaste para lhes responder?
Em termos do meu percurso até poder ser investigador, sinto que demorei algum tempo a consolidar conceitos essenciais ao trabalho académico nesta área. Como vim de uma licenciatura focada no mercado de trabalho, senti que cheguei ao mestrado bastante desamparado a nível teórico, mas também no entendimento do que constitui o trabalho académico. Aí foi uma questão de procurar trabalhar essas fragilidades e aproveitar o período da tese de mestrado para aprender muitas coisas que anteriormente deveria saber.
Já numa fase mais perto de me tornar investigador, diria que preciso de salientar dois desafios. Um deles, o mais pequeno, é algum conservadorismo que me parece ainda existir na área face à ideia da interdisciplinaridade com outros campos teórico-científicos além das Ciências de Comunicação. Acho que a ciência se enriquece quando existe a partilha e não quando nos fechamos numa pequena gaveta, sem abrir fronteiras.
Porém, o outro desafio de que quero falar é um desafio inúmeras vezes maior. E esse desafio é o financeiro. Não há forma de escapar. Após ter terminado o mestrado, mesmo tendo a boa experiência da tese, senti algum desnorte por não existirem estruturas pensadas para a incorporação de potenciais investigadores em universidades. Durante 1 ano fiz alguns biscates diversos, uns ligados à academia, outros não, sem conseguir qualquer independência real. No meio da indefinição e ainda com vontade de trabalhar na academia, decidi candidatar-me ao doutoramento sem ter qualquer perspetiva de como o pagar. Tive muita sorte nesse percurso, porque, coincidentalmente, foi mais ou menos no início do doutoramento que consegui entrar no projeto MyGender, que me financiou durante 2 anos e meio. Não fosse a sorte do timing e certamente teria de ter de desistir do doutoramento e desta carreira. Não tenho dúvidas de que é urgente que se construam formas de democratizar o acesso a profissões de investigação na academia. O regime atual perpetua um sistema de dependência financeira de pais e familiares, por parte do corpo produtivo da ciência em Portugal. Essa não é uma vida possível para todas as famílias, como a minha, tal como não é sequer digna. Esse foi, sem dúvida, o maior desafio que encontrei até agora. E não o vejo a ser mitigado.
Atualmente, dedicas-te exclusivamente à investigação?
A nível financeiro sim, até porque a exclusividade dos contratos de bolsas de investigação assim o obriga (comecei o meu contrato como bolseiro de doutoramento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia no passado mês de março deste ano). Mesmo a nível académico, tenho-me envolvido noutras atividades, como organização de eventos ou até lecionar algumas aulas. Mas procuro preencher a vida com mais coisas, inclusive participação política/cívica. Sempre tive uma enorme paixão pela música e pela comunicação da mesma. Sou locutor de rádio na RUC – Rádio Universidade de Coimbra, autor de um programa semanal que muito prazer me dá – Maldito Mojito – e, ocasionalmente, sou DJ.
Imaginas o teu futuro ligado à investigação ou gostavas de conhecer outras áreas e enveredar por outros caminhos?
Sinto mesmo que encontrei um lugar profissional onde posso continuamente me expressar e aprender. O processo de olhar para “coisas” e retirar daí ideias, argumentos, teses, é algo que tenho percebido que me entusiasma muito. Porém, para o bem da minha sanidade mental, não tenho uma trajetória profissional que queira obrigatoriamente seguir. Até porque não quero correr o risco de, se não a conseguir, sentir-me sempre em dívida para comigo mesmo, numa corrida desenfreada por uma utopia de um “trabalho perfeito”. Acho que vivemos todos com este mantra neoliberal enraizado, infelizmente. Tenho trabalho (mas não remunerado) já de alguns anos na rádio e essa sempre poderia ser uma via. Mas sem dúvida que quero continuar ligado à investigação, sinto que finalmente encontrei um caminho e é essa a minha prioridade profissional.
Por que motivo integras o GT de Jovens Investigadores e o que mais gostas no grupo?
O que mais gosto é a capacidade de estabelecer pontes entre pessoas que percebem melhor do que quaisquer outras as dificuldades desta vida. No meio da vida isolada que é a de quem passa anos a tentar escrever uma tese, acho muito importante que exista um espaço comum de partilha e de aprendizagem como o GT de Jovens Investigadores.