Começar de novo
Parafraseando um mote repetido, ad
infinitum, a propósito de muitas outras coisas, diremos que a FCT é
demasiado importante para ser deixada aos políticos responsáveis pela FCT.
A razão é óbvia: como se refere no próprio site da Fundação, “a história da
FCT, a sua criação e sua actividade (sic), confunde-se com o percurso da
própria história da ciência e da tecnologia e da organização da ciência em
Portugal.” (http://www.fct.pt/historia/)
Mesmo se a história da FCT não chega ainda a escassas duas dezenas de anos
– ela foi criada em 1997, era José Mariano Gago titular do novel ministério da
Ciência e Tecnologia -, a ideia de que o Estado deve contribuir decisivamente
para o fomento da ciência e tecnologia remonta pelo menos à criação da Junta
Nacional para a Investigação Científica e Tecnológica (JNICT), em 1967, de que
Mariano Gago foi um dos presidentes.
Para além daquilo que a lei estipula como sua missão, a política científica
concreta da FCT dependeu sempre muito quer da orientação política geral do
governo vigente quer, sobretudo, da visão dos seus presidentes: Luís Magalhães
(1997-2002), Fernando Ramôa Ribeiro (2002-2005), João Sentieiro (2006-2011) e
Miguel Seabra (2012-2015). Também porque, e excetuando talvez o exercício
governativo de Mariano Gago, estes presidentes constituíram, de facto, os
verdadeiros “ministros” da ciência em Portugal.
Esta realidade foi ainda mais patente no exercício do último presidente da
FCT, Miguel Seabra - que não se coibiu de ocupar amplamente, em matéria de
política científica, o lugar deixado totalmente vazio pelo ministro Nuno Crato.
Provavelmente, nenhum outro presidente antes de Miguel Seabra teve um poder tão
grande e tão decisivo como ele.
Ora, quanto maior o poder, maior o risco da discricionariedade. De facto,
“discricionária” é o mínimo que podemos chamar à ação do Professor Seabra à
frente da FCT, que teve como sua coroa de glória o bizarro exercício de
“avaliação” e “reestruturação” dos centros de investigação científica
portugueses, passando ainda por aspetos não menos gloriosos como a diminuição
drástica das bolsas individuais de doutoramento e pós-doutoramento ou a quase
eliminação dos projetos de investigação nas áreas das Ciências Sociais e
Humanas.
O atual ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor,
pensou - e bem - que urgia (urge) repensar a organização e a ação da FCT.
Criou, para isso, um Grupo de Trabalho integrando cientistas e investigadores
de várias regiões do País e de várias áreas científicas, incluindo as Ciências
Sociais e Humanas.
Estranhamente, porém, não incluiu nesse Grupo de Trabalho alargado nenhum
investigador das Ciências da Comunicação – uma área que engloba, em Portugal,
várias centenas de docentes e investigadores e largos milhares de estudantes de
licenciatura, mestrado e doutoramento.
A SOPCOM, enquanto associação científica representativa desses docentes,
investigadores e estudantes, não podia deixar de chamar a atenção do senhor
ministro para esse lapso (chamemos-lhe assim), pelo que decidiu enviar-lhe a
carta que se publica nesta newsletter.
Essa carta, até ao momento em que escrevemos, não teve qualquer resposta -
nem do senhor ministro nem de qualquer dos seus assessores.
Para quem diz pretender começar de novo esta não será, certamente, a
atitude mais adequada para começar…
Paulo Serra
Presidente da Direção da Sopcom