Quando maio foi em abril
Esta é a newsletter de maio de 2018.
Há cinquenta anos, em Paris, explodia o conjunto de eventos
a que hoje chamamos o “maio de 68”.
Cinquenta anos depois, o maio de 68 carece ainda de
explicações – não por falta delas mas, precisamente, porque elas são múltiplas
e, muitas vezes, contraditórias. A explicação histórica, reconhece-se, exige,
mais tempo, maior distância.
Seja como for, o maio de 68 envolveu múltiplas formas e atos
de comunicação: as manifestações e comícios nas universidades e nas ruas; os
conflitos entre estudantes e trabalhadores e a polícia; os grafitis com
palavras de ordem que se tornaram clássicas; as imagens das televisões oficiais
e não-oficiais; as fotografias de origem conhecida e desconhecida; os filmes
feitos por “trabalhadores do cinema” como Godard e o coletivo Dziga Vertov ou por
“cineastas” anónimos.
Essas múltiplas formas e atos de comunicação foram difundidos
praticamente por todo o mundo, dando ao maio de 68 um imenso impacto e
visibilidade.
Em Portugal vigorava, nessa altura, a ditadura do Estado
Novo, assente na defesa de valores como
Deus, a pátria, a autoridade, a família e o trabalho (tal como enumerados num
conhecido discurso de Salazar).
Ora, se havia valores que o maio de 68 punha em causa eram,
precisamente, esses que constituíam a base explícita da ditadura salazarista.
Não admira, assim, que a censura prévia e os órgãos de
informações do regime dessem, do maio de 60, (apenas) uma imagem de “desordem”,
de “revolução”, de “anarquia”, etc., que colocaria em causa aquilo que os
próceres do regime chamavam a “civilização ocidental”.
Por isso se pode afirmar que, no caso português, o maio de
68 chegou apenas em abril: em abril de 1974, entenda-se. Ainda que tenha
chegado sob uma nova forma, com outros protagonistas, com outras finalidades –
mas envolvendo, também, uma verdadeira explosão comunicacional, com grande
impacto entre nós e um pouco por todo o mundo.
Paulo Serra
Presidente da Direção da Sopcom